1 de nov. de 2010

Ondina

 À vista dos escolhos da praia, duros, escuros, imóveis, brilhantes da água que lhes bate mas insensíveis à frescura das ondas, chegou a ondina à espuma quebrada sobre as conchas do mar.

Cansada de tanto nadar, descansou a cara na areia fresca deixando que os olhos se banhassem na água salgada, cardumes de peixes cor-de-prata nadando por perto, estrelas do mar tecidas nos cabelos negros espalhados à luz da lua.

Agitam-se as rochas imóveis ao sabor de uma brisa morna que passa por perto, quente de risos de verão, memórias deixadas ao acaso nos seixos rolados da praia, da praia perdida da costa sonhada que nunca existiu.

Olho e já não vejo a ondina deitada na espuma das ondas, de cabelos negros espalhados nos seixos brilhantes à luz da lua quebrada pelas núvens negras e o vento norte.

A praia serena, molhada pelos beijos frescos das ondas de espuma e sal, devolve-me a paz na certeza de um dia sonhar este sonho outra vez. Olho para baixo e vejo os meus pés, verniz vermelho escamado nas unhas e falta de creme nos calcanhares. Queria ver escamas de prata e gotas de água fria, areia molhada numa poça debaixo de mim, mas o chão devolve-me os desenhos geométricos e as cores triplas do tapete persa e as minhas sandálias espalhadas de um lado e outro dos meus pés humanos.

Foi-se a ondina com as ondas da praia e ficou o desejo do sonho da costa sonhada que nunca existiu.

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